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sexta-feira, 24 de novembro de 2017

A águia e a galinha — Reflexão no dia do meu aniversário

Uma águia nunca voa só

Há anos, tive o privilégio de me cruzar com Leonardo Boff, um animador da teologia da libertação e um homem de visões largas ao modo da águia que, nas alturas, pode ampliar horizontes do planeta que habitamos. Dissertou, na conferência que proferiu no Porto, sobre ecologia, planeta terra, natureza e Deus, sem ousar sequer tocar, por mais levemente que fosse, na sua situação de padre a quem a cúria romana tentou cortar as asas e a amplitude do olhar e do sonho só possível de quem deseja fugir da limitada visão do terreiro que a galinha habita.
Vem isto a propósito de eu completar hoje 79 anos  e de me abalançar a algumas cogitações próprias de quem olha para trás em busca de algo marcante que tenha moldado, de alguma forma, a minha maneira de ser e de estar no mundo. E daí, o filme da minha existência passou a correr até estacionar num livro de Leonardo Boff – A águia e a galinha - Uma metáfora da condição humana – que me fez pensar. Recomendou-me o autor e conferencista, na hora dos autógrafos: «Fernando: Dê asas à águia que se esconde em você! L. Boff»
Embora nem sempre consiga seguir esse seu conselho, que a vida é feita de imprevistos, alegrias e deceções, procuro sair, no dia a dia, da pachorrenta banalidade da existência, se não pela coragem de viajar, ao menos pela riqueza de sonhar, que aí dificilmente alguém me leva a palma. E nesse sonhar, olho para mais uma passagem do referido livro: «É a hora e a vez da águia. Despertemo-la. Ela está se agitando nas mentes e nos corações de muitos. Não só. Ela anima a história e penetra na própria realidade íntima de cada ser humano. Uma águia nunca voa só. Vive e voa sempre em pares.» E mais adiante: «Cada um hospeda dentro de si uma águia. Sente-se portador de um projeto infinito. Quer romper os limites apertados do seu arranjo existencial. Há movimentos na política, na educação e no processo de mundialização que pretendem reduzir-nos a simples galinhas, confinados aos limites do terreiro. Como vamos dar asas à águia, ganhar altura, integrar também a galinha e sermos heróis de nossa própria saga?»

domingo, 26 de março de 2017

A galinha

Crónica de Maria Donzília Almeida



Estava eu com as mãos na massa, no sentido literal do termo, quando toca a campainha. Não estava a amassar o pão, em concorrência desleal com o diabo que já amassou muito, algum do qual lhe tenha tomado o gosto.
Estava apenas a dar uma ajudinha à massa, antes de a pôr na máquina de fazer pão. Uma volta à massa evita que a farinha aglomere nos cantos redondos da cuba e o pão ficando por cozer. Com os avanços da tecnologia, houve uma redução drástica no trabalho das donas de casa, que agradecem, restando-lhes assim mais tempo para a família.
Há uma diversidade de eletrodomésticos que facilitam, agilizam e economizam tempo e dinheiro, revertendo a morosidade e fadiga das tarefas domésticas em tempo de exercício e convívio familiar.
Tiro as mãos da massa e vou à porta ver quem chamou. Para meu grande espanto, deparo com algo tão insólito quão inesperado: um jovem, cheio de piercings e tatuagens e um corte de cabelo que está na berra – com um rabicho no alto da cabeça. Uma personagem de telenovela foi o modelo e logo ditou a moda. A juventude permeável a estas inovações segue-as logo, numa pura imitação.
Pouco dada a preconceitos e a juízos apriorísticos, confesso que o meu pensamento pecou um pouco, mas assumo-o — mea culpa! 
A minha estupefação não se ficou por ali, quando observei que o jovem trazia uma galinha debaixo do braço. O que estará ele aqui a fazer, naquele preparo? Foi o primeiro pensamento que aflorou ao meu espírito.