Crónica de Anselmo Borges no Diário de Notícias
1. Na perspectiva grega, o decisivo é conhecer a essência, por exemplo, o que é Deus? Na perspectiva hebraica, no que a Deus se refere, a perspectiva é outra: o que é que acontece quando Deus está presente? Foi assim que João Baptista, na prisão, mandou discípulos perguntar a Jesus se era ele o Messias. Jesus não deu nenhuma resposta teórica. Deviam eles próprios descobrir a verdade a partir do que viam que estava a acontecer: "Ide contar a João o que estais a ver e a ouvir: os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos ficam limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres é anunciada a boa notícia." O Messias verdadeiro é aquele que está presente em nome de Deus a aliviar os tremendos sofrimentos das pessoas, a abrir horizontes de esperança para todos, sobretudo para os pobres e abandonados. Jesus está aí, libertando da opressão e da indignidade, anunciando e realizando um mundo novo de alegria e dignidade para todos. Ele é o enviado pelo Deus compassivo, que sara e cura as feridas e liberta a vida: "Sede misericordiosos como o vosso Pai celeste é misericordioso." Mais do que dogmas e doutrina, o decisivo no cristianismo é a prática libertadora.
A revolução de Francisco foi anunciada desde o início, ao proclamar que ninguém devia ter vergonha da ternura, sendo a missão da Igreja levar adiante o projecto de humanização que Jesus quer: "Vejo com clareza que do que a Igreja precisa é de capacidade para curar feridas. Devemos encarregar-nos das pessoas, acompanhando-as como o bom samaritano, que lava e limpa as feridas e consola", "caminhar com as pessoas na noite, saber dialogar e inclusive descer à sua noite e obscuridade sem nos perdermos".