sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Simplesmente Maria

Crónica de Maria Donzília Almeida


Quando cheguei à US tudo era novo para mim: os espaços, as pessoas, a natureza envolvente. A primeira pessoa com quem me cruzei, ocupava-se nas suas tarefas de horticultura ali, na Quintinha da Remelha. Com solicitude, deu-me as informações pretendidas e franqueou-me as portas do US…
Este nome evocava-me uma antiga instituição, vocacionada para o tratamento de toxicodependentes da Associação Le Patriarche, fundada em 1974, por Lucien Engelmajer.
As histórias de vida que ali se cruzaram, os dramas de jovens colhidos na teia das vicissitudes humanas, na sua luta contra a tirania das dependências, parecem ter deixado, aqui, um rasto de erosão. Um véu de decrepitude paira neste espaço, a começar nas palmeiras de braços caídos, que sucumbiram aos parasitas invasores.
Direcionada, hoje, para o apoio social à população carenciada, é também a sede da Universidade Sénior. Esta oferece um leque diversificado de atividades que promovem um envelhecimento ativo, para a população da MaiorIdade.
Fui conhecendo pessoas, fui criando laços, fui-me entrosando no ambiente sénior. No contacto diário com os demais formandos, nas áreas que frequento, comecei a aperceber-me da existência de uma criatura que monopolizava as atenções e o interesse de todos.
— Hoje, trouxe um miminho para a Maria…
— Vamos cuidar da saúde da nossa Maria... ela precisa de vacinas…
Estas conversas estavam na ordem do dia. Eu ia ficando cada vez mais intrigada e já imaginava uma criancinha sem abrigo e que estaria sob a proteção dos formandos da US…
— No ano passado até nos cotizámos para levar a Maria ao dermatologista… pois ela teve um mal de pele…
Adensava-se a minha curiosidade… e a minha compaixão perante aquele caso de tão grande infortúnio…
— Chegámos a construir-lhe uns aposentos, aqui na Casa de Remelha, para a abrigar do relento da noite — acrescentou alguém, espicaçando ainda mais a minha estupefação.
— De quantas assoalhadas? — pensei eu, com os meus botões… mas sem ter a coragem de inquirir.
Quando via, repetidamente, pessoas a chegar com latinhas de conservas (!?) para a Maria, não resisti por mais tempo à curiosidade e indaguei onde estava a protegida da US.
— A Maria, não sabe? É a nossa gatinha de estimação que nos adotou como seus donos. Quando chegamos, vem logo a miar, ao nosso encontro e roçar-se nas nossas pernas. É um encanto!
O nome Maria que muitas mamãs dão aos seus rebentos, só ou combinado com outros nomes, pois resulta sempre numa conjugação harmoniosa, que eu já vi atribuído a uma cadelinha é a mascote da US.
Eu que tenho uma preferência marcada pelos caninos, tive que render-me à evidência e admitir a minha simpatia pelos felinos, ou melhor, pela Maria, já que a generalização seria um pouco perigosa. 
Gostava de ter uma fração do protagonismo da “menina” Maria que apenas mia.. mia. Eu… falo, gesticulo, vocifero… mas a Maria é uma vedeta reconhecida! Eu sou uma aspirante a atriz…
Há mais Marias na terra… mas eu gosto desta Maria, da cadelinha Maria, de todas as minhas amigas Marias… e eu também sou Maria…

26.02.2016

2 comentários:

  1. Também a minha netinha mais nova, é: Simplesmente, MARIA!!!
    Quem se lembra desta radio novela dos anos setenta do Século passado?!...

    ResponderEliminar
  2. Lembro-me eu...muito bem! É que eu já sou vetusta...
    Já atravessei dois séculos...





    ResponderEliminar