sábado, 19 de dezembro de 2015

Feliz és tu porque acreditaste

Reflexão de Georgino Rocha

Georgino Rocha
«Faz mais barulho uma árvore a cair 
do que uma floresta a crescer»


Isabel surge como a porta voz que interpreta o que Deus havia feito em Maria. E proclama a felicidade de quem crê que o Senhor cumpre as promessas, é fiel à palavra, tem um tempo para intervir, escolhendo a pequenez humana para desvendar o seu jeito de ser e de agir com solicitude amorosa. Mostra o valor do insignificante e a grandeza da pequenez aos “olhos” do mundo, dos que julgam e apreciam as pessoas e as coisas pelas aparências e categorias sociais e religiosas.

“Feliz és tu porque acreditaste”, tu que vens a mim, deixando o conforto da tua casa de Nazaré, pobre terra da Galileia, percorreste montanhas, enfrentaste as surpresas da viagem distante e chegaste cheia de alegria e confiança. Tu, jovem donzela, a iniciar uma gravidez promissora, a acariciar a realização dos sonhos alimentados por uma promessa divina, a dar provas da novidade que Deus suscita por intermédio daquele que está no teu seio. Tu, a mulher disponível e pronta para a entrega incondicional, para o serviço mais arriscado, para a missão humilde com a maior projecção na história.

A leitura de Isabel está recheada de alusões que a piedade cristã agrupa na oração da Avé Maria. Ela é bendita entre as mulheres. Bendito é o fruto do seu ventre, o querido filho Jesus. Ela é a santa mãe de Deus, sempre pronta a valer-nos, a tomar-nos pela mão e a guiar-nos nos caminhos da vida, sobretudo na grande viagem, a hora da nossa morte.

Maria e Isabel encontram-se e louvam o Senhor pelas maravilhas realizadas. Não evocam os perigos ocorridos nem as surpresas desagradáveis. O pessimismo da vida e as lentes escuras do “olhar” a realidade envolvente não tém lugar no seu coração. Não porque estejam insensíveis aos “golpes” dos acontecimentos e das circunstâncias, mas porque a certeza da fé e a firmeza da esperança dão consistência à decisão da vontade apaixonada pela verdade e limpidez ao coração impregnado de amor de doação.

Que bela lição para os nossos tempos! A avalanche de notícias difundidas gera a impressão negativa de que ainda não foi superado o “muro das lamentações” e não se deixa de bater com a cabeça na parede. A sabedoria popular lá vai repetindo que faz mais barulho uma árvore a cair do que uma floresta a crescer. E é o que nos conforta. Tanto bem que nunca chega a ser notícia, boa nova, semente de evangelho. Não porque não exista. Mas porque há uma filtragem intencional e programada que visa impor a cultura do silêncio em certas áreas da vida humana, familiar, social, religiosa. E o desconcerto pode atingir os próprios crentes.

A jovem judia, Etty Hillesum, que morreu numa câmara de gás em Auschwitz, em 1943, deixou escrito no seu “Diário” que “Deus, às vezes não se consegue entender e aceitar aquilo que, sobre esta terra, os teus semelhantes fazem uns aos outros, nestes tempos selvagens. Mas nem por isso eu me fecho no meu quarto, Deus: eu continuo a olhar para as coisas de frente e não quero fugir diante de nada. Eu tento compreender os crimes mais graves, todas as vezes eu tento reencontrar o rasto do homem, na sua nudez, na sua fragilidade; desse homem que muitas vezes se tornou irreconhecível. Sepultado entre as ruínas monstruosas das suas ações insensatas".

O tempo do Advento convida-nos a "reencontrar o rasto do homem na sua fragilidade". Maria e Isabel deixam-nos o seu belo exemplo e edificante diálogo. Em tão boa companhia, acolhamos o Deus Menino que vem ensinar-nos a sermos humanos com qualidade divina.

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