sábado, 3 de agosto de 2013

Multidões de mãos vazias

O valor dos bens e o sentido da vida




«Outrora como agora, a avareza tende a apoderar-se do coração humano que fica sem espaço para mais nada nem ninguém; a fazer-se centro de preocupações absorventes e de atitudes invejosas; a transformar os bens no deus da vida a quem se sacrifica tudo: amizades, família, profissão, honestidade e integridade, futuro que se reduz ao presente fugaz, consciência que se cala perante a conveniência. A erguer celeiros de prosperidade para alguns e a deixar multidões “de mãos vazias”.»

Georgino Rocha



Jesus continua o rumo da viagem para Jerusalém e apresenta a sua mensagem em ensinamentos de vida, tirando partido das ocasiões que provoca ou aproveita. Os autores dos Evangelhos articulam, de forma literária bela, a sequência destes ensinamentos, desvendando o sentido mais profundo da viagem enquanto escola de discipulado, itinerário de doação e espiritualidade, estágio de acção missionária.
Uma das ocasiões surge ao ouvir o pedido anónimo de alguém que queria que ele interviesse numa questão de partilhas de herança familiar entre irmãos. Este pedido mostra que Jesus é reconhecido como rabino e, como tal, podia solucionar legalmente tais questões (Dt 21, 15-17; Nm 27, 1-11). A resposta parece evasiva, embora afável, e tem a forma de uma interrogação: “Amigo, quem me fez juiz ou árbitro das vossas partilhas?” E a ilustrar a sua recusa, continua o ensinamento sobre o valor da vida que supera todos os bens. Termina com uma exortação: Guardai-vos de toda a cobiça; a vida não depende da abundância dos bens.

Outrora como agora, a avareza tende a apoderar-se do coração humano que fica sem espaço para mais nada nem ninguém; a fazer-se centro de preocupações absorventes e de atitudes invejosas; a transformar os bens no deus da vida a quem se sacrifica tudo: amizades, família, profissão, honestidade e integridade, futuro que se reduz ao presente fugaz, consciência que se cala perante a conveniência. A erguer celeiros de prosperidade para alguns e a deixar multidões “de mãos vazias”.

Jesus quer visualizar o seu ensinamento e narra uma parábola familiar aos ouvintes: O agricultor que consegue uma boa colheita, armazena-a e, (im)previdente, pensa que está provido para muitos anos e, portanto, pode cuidar apenas de si, descansando e regalando-se. Naquela noite, ocorre a sua morte. E os bens guardados no celeiro da fortuna para que servem? A quem aproveitam? De que lhe valem?
“Insensato!” – exclama Jesus, apontando a função dos bens ao serviço da vida, a felicidade de ser rico aos olhos de Deus, a alegria de saber repartir por quem precisa, de ter um coração amigo e benfazejo.
“Eu mostro-te onde podes guardar melhor o teu trigo – diz Santo Ambrósio, bispo de Milão no século IV – onde podes estar seguro de que não serão roubados pelos ladrões: Dá-o aos pobres”

Georgino Rocha

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