quinta-feira, 25 de outubro de 2007

MEDOS E PERPLEXIDADE DOS MAIS IDOSOS



Como cuidadosa preparação da opinião pública, em ordem a um clima propício à aceitação da eutanásia, tal como já aconteceu em relação ao aborto, deu-se grande visibilidade a um inquérito nacional feito a idosos internados em lares diversos. Não faltaram opiniões variadas a fazer a leitura do resultado e títulos tendenciosos a orientar para conclusões. Já estamos habituados.
A situação pessoal e social dos mais idosos é talvez o problema mais preocupante e grave a que assistimos hoje. Cresce o número dos que não têm lugar na casa que construíram com muito amor e sacrifício, e que hoje é casa de filhos, demasiadamente ocupados para poderem ser sensíveis; cresce o número de famílias desestruturadas para as quais o idoso se tornou um intruso incómodo; é difícil a situação de muitas famílias em que o casal trabalha fora, vive em casa exígua e rendimento reduzido e leva, ainda e diariamente, o cuidado de um idoso querido que tem consigo e dos filhos que começa a distribuir, por instituições adequadas, ainda o sol vem longe; são muitos os idosos que vivem nos meios rurais com filhos emigrados no estrangeiro ou, embora cá dentro, a quilómetros de distância; não faltam idosos isolados, de quando em quando, roubados e espancados, sem se ver como protegê-los. O tempo de vida alargou-se, mas a vida de um idoso, ainda que em condições regulares de saúde e de conforto, tem exigências múltiplas, nem sempre com resposta fácil.
Por outro lado, surgem, por todo o lado, iniciativas que minimizem as carências e dêem alguma satisfação às situações existentes: casais que regressam à terra para cuidar dos seus idosos; estruturas regulares de apoio a partir de instituições de solidariedade, como lares, centros de dia, apoio domiciliário, acolhimento nocturno, centros de convívio; estímulos do Estado, traduzidos, por exemplo, em pensões sociais e desconto em medicamentos; são múltiplas as actividades de lazer, passeios turísticos, férias em zonas adequadas; preparam-se profissionais e voluntários para tratar idosos e lidar com eles; há literatura diversa a chamar a atenção para os idosos e seus problemas e até meios organizados para aproveitar e valorizar as suas qualidades e capacidades. As situações são muito diversas e o que de uns podem beneficiar, outros desconhecem-no.
Para todos, a família quando a têm, e o amor que dela se espera, porque a ele se tem direito, é e será sempre o maior e o mais indispensável apoio e estímulo ao viver de um idoso. Ninguém pode viver sem amor. Só pensa na morte, dela fala e a deseja, quem não se sente amado. Todos os outros meios, mesmo os mais válidos, ou têm o tempero do amor ou perdem, a pouco e pouco, o seu sentido e valor. Assim o inquérito o revela.
É uma preocupação lamentável a de muitos filhos, sem preocupação de procurar a melhor solução, tentarem internar os seus idosos em lares. Por isso há nestes listas de espera por todo o lado. Para muitos destes filhos, idoso internado é, depois, idoso pouco ou nada lembrado e visitado. E isto é o que mais dói a um idoso, arrumado e esquecido. Só o desabafa com quem confia, mina-lhe por dentro a alegria e a vontade de viver, tem a sensação de indesejado, a vida perdeu o sentido e, no horizonte, só a morte aparece.
A solução para estes casos, que infelizmente aumentam, não é a eutanásia, mas a humanização das relações familiares; o avivar da consciência dos filhos, que também são pais e têm, em relação aos seus idosos, uma dívida nunca paga; o fomento da solidariedade comunitária, que se torna família dos que a não têm; a preocupação dos lares serem lares de família com a família, e não armazéns de quantos mais melhor…
A casa onde viveu, ainda que pobre, é a que o idoso, em situação normal, sempre preferirá. Haja amor de quem o pode e deve dar e os idosos manifestarão a sua verdade. Todos, no seu juízo, preferem a alegria de viver, à pressa de morrer. Todos preferem, a seu lado, quem os ame e lhes prolongue a vida, a quem, anónimo, lhes apresse a morte.

António Marcelino

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