segunda-feira, 31 de julho de 2006

Quadros da Ria de Aveiro

Zé Penicheiro: "Amanhecer", acrílico s/tela, 35x27
A luz estremece antes de pousar ::
“A ria é um enorme pólipo com os braços estendidos pelo interior desde Ovar até Mira. Todas as águas do Vouga, do Águeda e dos veios que nestes sítios correm para o mar encharcam nas terras baixas, retidas pela duna de quarenta e tantos quilómetros de comprido, formando uma série de poças, de canais, de lagos e uma vasta bacia salgada. De um lado o mar bate e levanta constantemente a duna, impedindo a água de escoar; do outro é o homem que junta a terra movediça e a regulariza. Vem depois a raiz e ajuda-o a fixar o movimento incessante das areias, transformando o charco numa magnífica estrada, que lhe dá o estrume e o pão, o peixe e a água da rega. Abre canais e valas. Semeia o milho na ria. Povoa a terra alagadiça, e à custa de esforços persistentes obriga a areia inútil a renovar constantemente a vida. (...) Na ria o ar tem nervos. A luz hesita e cisma e esta atmosfera comunica distinção aos homens e às mulheres, e até às coisas mais finas na claridade carinhosa, delicada e sensível que as rodeia. A luz aqui estremece antes de pousar…"
In “Os pescadores”,
de Raul Brandão

1 comentário: