terça-feira, 28 de março de 2006

Um artigo de Francisco Perestrello, na Ecclesia

O Humor e a Guerra Mesmo sendo certo que a vida real é composta de drama e comédia, muitas vezes com forte predominância do primeiro, também é certo que o Cinema prefere marcar de uma forma clara o género em que insere determinada obra. As comédias são para rir; os dramas para "chorar". Com o avançar dos anos tal atitude foi-se diluindo, tomando uma posição, cada vez mais forte, a chamada comédia dramática, em que o mundo se vê um tanto mais equilibrado, com vertentes risonhas convivendo com outras em que a felicidade não tem lugar.Quando, em 1997, Roberto Benigni realizou "A Vida É Bela", até certo ponto abriu-se uma nova janela. A vertente humorística era suficientemente marcada para ser inegável estarmos perante uma comédia; a vertente dramática era tão dura que não podia deixar de despertar cruéis memórias - recordações para uns, informações para outros - de uma dureza incontornável. Benigni repete a receita em "O Tigre e a Neve". Não temos já os nazis e os seus crimes de guerra sobre populações civis, mas antes a situação iraquiana resultante de uma guerra que inicialmente pareceu demasiado fácil. Uma vez mais o espectador se confronta com um actor que actua em tom de farsa, dirigido por um realizador - que é a mesma pessoa - que aprofunda e trata os acontecimentos de forma a deixar bem viva a expressão da crueldade humana. Dois estilos contraditórios, com os mesmos factos observados ou observáveis sob as duas diferentes perspectivas. Tirar humor das desgraças de cada personagem não é trabalho fácil, sobretudo quando se quer manter a verdadeira dimensão do drama sofrido. Pode dizer-se que Benigni iniciou um novo estilo de comédia/drama, capaz de chocar alguns espectadores mas que tem a qualidade de expor uma sólida crítica social, mesmo que esta só seja assimilável com uma cuidadosa leitura de cada obra e o abandono de alguns preconceitos que se possam opor à forma de tratamento do tema.

Sem comentários:

Enviar um comentário