terça-feira, 31 de janeiro de 2006

Um artigo de António Rego

O ESPLENDOR DA CARIDADE
Algo de surpreendente aconteceu em torno da primeira Encíclica de Bento XVI. Com um título curto, óbvio, aparentemente abstracto para as lógicas de marketing de hoje, eis que suscita um volume impensável de informação e comentário, quer nos media confessionais, quer nos laicos ou mesmo adversos. E em todos os casos, com algum desconcerto acerca dum homem que foi duramente criticado antes de ser Papa e, quando eleito, apontado por apressados comentadores, de conservador impiedoso e intolerante.
Ainda que muitos continuem a falar sem nada perceberem do que dizem, eis que paira um olhar suspenso sobre uma Encíclica acerca do Amor que surge com uma clareza meridiana, um suporte histórico e bíblico em tudo o que exprime, desde a antiguidade clássica, passando pelo Antigo e Novo Testamento, e descendo às mais duras exigências no terreno social.Tudo se tece com uma lógica cerrada, uma argumentação sólida e simultaneamente uma doçura inexcedível, ao olhar Deus como Amor e o homem e mulher como seres amados, e que se amam no seu todo sem pertença ou exclusão de Afrodite ou Platão.
Nesta palavra do Papa o amor humano ganha um estatuto de nobreza no seu todo de pessoa, mais que soma ou exclusão de corpo e espírito. Por isso Bento XVI nem por um momento se esquiva à temática do amor, na viagem fascinante do eros à agape, procurando, como disse, restituir à Caridade todo o seu esplendor. E tudo se consumando, tal como havia procedido, no amor de Deus.
Bento XVI entrou num terreno essencial de Deus e do homem. Sem um entendimento sobre o amor, a nada nem a ninguém se pode pedir clareza, entrega, afecto. Sem arremessos nem condenações primárias de moral legalista, o Papa convida a Igreja e quem se sinta dela companheira no itinerário da história, a um retempero de esperança e de força pela aproximação ao calor imanado do âmago de Deus.
Estamos perante um hino, mais convincente e sedutor que qualquer arremesso de condenação ao homem de hoje, ele próprio profundamente carente da experiência do Amor à medida de Deus. Quem experimenta a dessedentar-se nas águas cristalinas não mais vai beber às lamas dos pântanos desgovernados.

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